Um hobby, uma opção para fugir da realidade sem sair do lugar, um hábito importante para quem busca ter conhecimento e uma boa retórica, uma forma de aprender. A leitura é isso e tanto mais, mesmo em tempos de tantas telas e tantas informações pipocando das mais diversas fontes que parecem competir entre si sobre quem informa mais com o mínimo de texto.
Seja na forma impressa, seja no formato digital, com muitas ou poucas páginas, do gênero ficção, do gênero jornalístico, do gênero biográfico, a literatura densa ou rápida continua sendo valorizada nas mais diversas faixas etárias, provando que é uma prática que não apenas resiste, mas se adapta às mudanças, ao tempo, e principalmente ao público.
Colunista do DIÁRIO já há quase três décadas, o jornalista Elias Pinto inicia sua história de amor com os livros ainda no início da adolescência, quando aluno do que se chamava de “ginásio” – hoje entendido como as últimas séries do Ensino Médio – e em uma fase ligeiramente rebelde, mas que ao mesmo tempo gostava de leituras. “Eu acabei escrevendo bem por gostar de ler. Uma coisa levou à outra”, reconhece.
“Mas eu sempre conciliei isso: de um lado, o cara meio contestador, um moleque que sempre respondeu, sempre foi do contra, digamos assim. E do outro, um fascinado pela leitura, que veio das revistas em quadrinhos, claro, primeiro, e depois pelo Monteiro Lobato [1882-1948], aquele que abriu para mim as portas da percepção da leitura. E também mergulhei nos livros do Júlio Verne [1828-1905]”, relata ele, que se diz até hoje um apaixonado pelos personagens do Sítio do Pica Pau Amarelo, principalmente pela Emília. “O gênio dela, isso sempre me conquistou, talvez seja o meu maior ídolo literário”, revela.
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Elias garante que dali em diante não houve um dia sequer sem ler um livro, e que tudo se intensificou ainda mais quando iniciou seu contato com o Jornalismo, ao lado de repórteres como Euclides “Chembra” Bandeira (falecido em 2000) e outros que faziam parte do que ele chama de “turma das antigas”.
“Eu não entendo quando as pessoas dizem que têm preguiça de ler. Eu tenho preguiça, um monte de preguiça, de escrever até, né? Mas preguiça de ler, nunca tive. Ler sempre foi um prazer imenso, esse momento recolhido. É como uma religião. Hoje é tudo pela internet, mas quando vinham jornais aos sábados e domingos, anos 80, 70 e 90 ainda, eu saía das bancas de revista com as gordas edições aos domingos do Estado de São Paulo, da Folha de São Paulo, do Jornal da Tarde, do Jornal do Brasil, eram imensas porque vinham com os cadernos literários, os suplementos culturais. Então isso foi se diversificando”, lembra.
Para ele, a desvalorização da palavra escrita passa pela realidade da linguagem telegráfica das redes sociais e pelo próprio entendimento sobre o que é uma escrita responsável.
“Tivemos a proliferação dos blogs, dos influenciadores, daqueles que escrevem e não apuram. Muitos se dizem jornalistas, mas muitas vezes recebem uma informação e a publicam sem apurá-la. Por isso é que o Jornalismo vem tentando se manter em meio a esse universo de informações. Vejo que é muita informação, mas ela é toda na superfície, né? E no entanto, as pessoas são desinformadas”, analisa, em tom de preocupação.
Pela atuação de crítico literário, Elias conta que recebe com frequência novos títulos de diversas editoras brasileiras, porém confessa que gostaria de ter mais tempo para ler todos.
“Olha que chego a ler 20 livros simultaneamente, mas dá um mês e eu não consigo terminar sequer um! Ainda me surpreendo com isso, às vezes estou, ao mesmo tempo, lendo ensaios políticos e biografias – são os que mais leio -, poesia, jornalismo, história, filosofia… Os livros que tenho nem sei mais quantos são, se são cinco mil, dez mil, 15 mil, perdi as contas faz tempo. Mas estou há um ano transferindo a minha biblioteca da casa que eu morava para a casa que moro agora e encontro títulos que tenho há dez, 20 anos e que nunca li – e que na verdade eu chamo de ‘BiblioKaos’”.
Por incrível que pareça, bibliotecas públicas nunca fizeram muito a cabeça do jornalista, nem mesmo as do colégio, e ele confessa que isso tem mais a ver com algum egoísmo do que qualquer outra coisa. “A verdade é que eu sempre quis o livro para mim, mesmo sem condições financeiras para isto. Livro era e é para mim algo a ser conquistado. Eu sempre quis ter uma biblioteca”, explica.
A composição da vasta biblioteca de Elias também é feita de histórias e situações engraçadas e/ou inusitadas, que vão desde o fato de ele mesmo ter trabalhado em livrarias, no intento de ter acesso a mais títulos, às incontáveis vezes em que se valeu do crediário de tantas livrarias que hoje não existem mais, como Jinkings, Nossa Livraria, fora a busca por sebos, feiras e bienais inclusive em outros estados, como Rio de Janeiro e São Paulo.
“Uma vez, no aeroporto do Galeão (RJ), fui chamado à área de despacho de bagagens porque uma sacola enorme que eu havia despachado estava ‘vazando’ livros e precisava de um reforço. Passaram uma fita, ficou um negócio enorme, parecia uma jiboia!”. Com tristeza ele confirma que diversos títulos ele acabou perdendo ao longo dos anos para o clima úmido da capital paraense, e também que pensa, em um futuro não muito distante, em vender ou doar parte de sua vasta coleção.
O sonho de leitor de Elias Pinto é ver reeditada a obra do escritor paraense Haroldo Maranhão (1927-2004), de quem foi amigo pessoal e a quem considera tão relevante quanto o conterrâneo Dalcídio Jurandir (1909-1979), reeditado nos últimos anos. “Tenho inclusive várias entrevistas que fiz com Haroldo e que quero reunir para lançar como livro. Acho que ‘Cabelos no Coração’ está entre os grandes livros da nossa literatura”.
A tecnologia chega para todos e chegou para ele também, e durante a pandemia, quando as tão adoradas idas às livrarias precisaram ser temporariamente suspensas. “Foi quando eu descobri a Amazon! Achei maravilhoso, pedia pela internet e chegava em casa. Devo ser um dos maiores consumidores de livros daqui de Belém pela Amazon, pedia quantidades absurdas, ia garimpando como se estivesse em um sebo – às vezes digitava nome de determinado livro que eu procurava há 20 anos e tinha lá!”.
Elias conta que até tentou ser adepto da leitura digital, porém sem sucesso até agora. “Tenho leitor eletrônico, compro e-books, mas nem sei se alguma vez terminei algum. Às vezes a assessoria de imprensa de alguma editora diz ‘olha, a gente manda o PDF, a edição eletrônica’. E eu digo ‘ok, mas manda o físico também’. Tenho uma dificuldade mesmo”, justifica. Com as edições diárias dos jornais que têm ou tiveram versões impressas, aí a situação é mais tranquila. “Todo dia leio o jornal, o site do jornal, né? Continuo lendo lá os cadernos literários”, afirma.
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